O conselho consultivo sobre internet e eleições criado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não apresentou resultados efetivos no combate a proliferação de notícias falsas até o fim do primeiro turno da campanha.
Formado por integrantes da Justiça Eleitoral, do governo federal, do Exército e da sociedade civil, o conselho se reuniu sete vezes para, basicamente, discutir o que é fake news e quais medidas poderiam ser tomadas para evitar sua disseminação. As fake news proliferaram durante a campanha, muitas delas distribuídas pelos canais de comunicação instantânea.
Pesquisa do Datafolha divulgada nesta semana mostra que a maioria dos brasileiros tem conta em algum desses serviços, para conversa com familiares e amigos, sendo um fator importante para a decisão do voto.
O grupo do TSE foi criado em dezembro, no fim do período de ministro Gilmar Mendes na presidência. O órgão tornou-se uma bandeira da gestão do ministro Luiz Fux, sucessor de Mendes. Ele permaneceu à frente do tribunal de fevereiro a agosto de 2018, quando Rosa Weber assumiu o cargo.
Não saiu do papel, por exemplo, a promessa de regulamentação de resoluções do TSE para que o tribunal pudesse gerenciar o cenário de fake news.
A resolução poderia criar normas de organização e procedimento, como solicitar ao Facebook examinar se determinado conteúdo está sendo explorado por perfis falsos, proibir sites que usam mineração de dados de fazer propaganda eleitoral ou determinar regras sobre como deve ser a propaganda na internet.
Por não ter sido normatizada, a fake news é tratada como propaganda irregular pelo TSE —até agora o conselho consultivo não foi acionado pelos ministros.
Na quarta (3), o candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, acusou a campanha de Jair Bolsonaro (PSL) de distribuir nas redes sociais informações falsas e vulgares contra sua família para prejudicá-lo na corrida presidencial.
Segundo um meme que viralizou no Facebook, Haddad teria dito que caberia ao governo decidir sobre o gênero de crianças. Não há registros, porém, de que o petista tenha feito essa afirmação, conforme mostrou o Folha Informações, serviço de checagem do jornal.
Outra fake news distribuída pelos aplicativos diz que votar apenas para Presidente da República e escolher a opção branco para os demais cargos em disputa nesta eleição faz com que o voto do eleitor seja classificado como “parcial” e, por essa razão, seja anulado.
Segundo o Datafolha, a taxa dos que pretendem votar em Bolsonaro para presidente e que compartilham conteúdo político pela mais rápida delas, o WhatsApp, é o dobro da verificada entre os eleitores de Haddad (40% contra 22%, respectivamente).
O PT de Haddad, no entanto, está entre os quatro partidos que não assinaram com o TSE um termo de compromisso de combate a notícias falsas. O documento foi firmado em junho.
Segundo a assessoria do tribunal, das 35 legendas registradas, quatro estão fora do compromisso —além do PT, as demais são PCO, PSTU e PTC. O PSTU, porém, diz que assinou o documento.
Esse acordo anunciado pelo TSE não estabelece diretrizes, é genérico, ressaltando apenas que as legendas iriam colaborar contra a disseminação de notícias falsas.
Segundo o tribunal, até quarta-feira (3) foram identificados 19 processos (representação por irregularidade na propaganda) que tramitam ou tramitaram no tribunal com a temática de notícia falsa.
Segundo o secretário-geral do TSE, Estêvão Waterloo, apesar da falta de resultados práticos, a atuação do conselho é positiva.
“Fizemos exaustivo trabalho antecipado de esclarecimento com manuais e páginas e o que poderia ser entendido como conceito de fake news, lei eleitoral que prevê punição”, afirmou.
Segundo a assessoria de imprensa do TSE, as ações até agora “tiveram o condão de pautar o debate e construir alianças que possibilitaram aos atores envolvidos adotar iniciativas autônomas para frear a disseminação de conteúdos nocivos. Podemos citar o exemplo das plataformas tecnológicas, que embutiram mecanismos de prevenção às fake news, e os veículos de comunicação, que criaram suas próprias ferramentas de fact-checking”.
Para Cristina Tardáguila, diretora da Agência Lupa, de checagem de fatos, “a única instância que efetivamente combateu as notícias falsas na velocidade em que elas precisam ser combatidas foi a imprensa, mais especificamente os checadores de fatos profissionais”.
Em junho, o TSE assinou também memorandos de entendimento com Google e Facebook, além de entidades representativas de mídia.
O Facebook diz que tem trabalhado com acadêmicos e agências de verificação de fatos para reduzir a disseminação de conteúdos enganosos e dialogado com autoridades eleitorais. “Também trouxemos para o Brasil nossas ferramentas de transparência de anúncios políticos, permitindo que as pessoas identifiquem propaganda eleitoral na plataforma”, informou.
De acordo com o Google, o memorando com o TSE foi “importante marco” no compromisso multissetorial “com iniciativas para combater a desinformação”.
“Desde setembro, é possível acompanhar as últimas notícias e atualizações do TSE diretamente no aplicativo Google Notícias”, disse a empresa por meio de nota.
O WhatsApp disse que brifou o TSE sobre como o aplicativo é um mensageiro de mensagens privadas e o funcionamento da criptografia de ponta a ponta.
O aplicativo promoveu outras mudanças para combater fake news, mas que não são associadas ao TSE, como adicionar um marcador para avisar aos usuários quando uma mensagem recebida não foi criada pela pessoa que a enviou ou limitar o encaminhamento de mensagens para evitar comportamento de spam.
O Twitter informou que mantém diálogo constante com as autoridades eleitorais brasileiras, “como faz em todo o mundo” e que apoia as campanhas e outras ações de comunicação da Justiça Eleitoral.
Folha de São Paulo