Manter os parlamentares brasileiros não é barato. Todos os anos, cerca de R$ 24,7 milhões são necessários para garantir os salários, benefícios e penduricalhos, entre outros gastos do Poder Legislativo, de cada um dos 81 senadores e 513 deputados federais, um batalhão de quase 600 políticos escolhidos periodicamente para trabalhar no Congresso Nacional e que disputarão um desses cargos nas eleições deste ano.
A conta é de um estudo divulgado em 2021 por pesquisadores das universidades de Brasília, do Sul da Califórnia e do Instituto de Matemática Pura e Aplicada. Para chegar ao resultado, os pesquisadores usaram o Orçamento anual total do Legislativo federal, dividiram pelo número de parlamentares e depois pela renda média da população.
A pesquisa comparou 33 democracias pelo mundo e concluiu que o Brasil é o país que mais gasta por parlamentar em comparação com a renda média do país.
Distantes da realidade
Quando se fala apenas sobre o salário de um senador ou deputado, de R$ 33.763 por mês, a renda está muito além da realidade brasileira, como mostram os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No quarto trimestre de 2021, a renda média do trabalho no país foi de R$ 2.447, o menor valor de toda a série histórica da Pnad Contínua, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, iniciada em 2012.
Segundo as conclusões do estudo, o orçamento anual para a manutenção dos parlamentares é 528 vezes a renda média da população brasileira. “Nos demais países analisados, essa diferença é de cerca de 40 vezes”, afirma a socióloga e cientista política Mayra Goulart, que é professora na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Além do salário, deputados federais e senadores brasileiros contam, por exemplo, com até R$ 106 mil por mês para contratar até 25 secretários — número maior de assessores quando comparado a países como Estados Unidos (18 funcionários), Chile (12) e França (12), por exemplo.
“Apenas o salário mensal, sem considerar os demais benefícios concedidos, já coloca os parlamentares brasileiros entre os mais bem pagos do mundo e os mais bem pagos da América Latina”, afirma a pesquisadora Jayane Maia, do German Institute for Global and Area Studies (Giga Hamburgo) e da Universidade de Erfurt, da Alemanha.
Comparando somente o salário, o parlamentar norte-americano ganha mais do que o brasileiro. Se um deputado ou senador no Brasil tem o holerite na casa dos US$ 80 mil anuais, nos Estados Unidos eles ganham US$ 193 mil no mesmo período — mais do que o dobro.
Projetos propõem redução, mas estão parados
Há um movimento querendo reduzir os custos por parlamentar federal. “Hoje, estão em tramitação mais de dez projetos de decretos legislativos que propõem a redução do subsídio dos parlamentares, apresentados principalmente após o início da pandemia”, comenta Jayane Maia.
Uma das propostas em tramitação é o projeto de decreto legislativo 1/2015, apresentado pelo ex-deputado federal Cabo Daciolo (então filiado ao PSOL e agora no PROS), que revoga o aumento salarial dos congressistas aprovado em 2014.
Com isso, o valor voltaria a ser de R$ 26.723,13. A última ação legislativa registrada na Câmara sobre o projeto foi a designação da relatoria para o parlamentar Marcelo Ramos (PSD-AM), em junho de 2021.
Durante os primeiros meses da crise do coronavírus, entre março e junho de 2020, parlamentares apresentaram propostas para reduzir o salário para até R$ 16.881,50 ― com o objetivo de que a mudança se tornasse definitiva. Os projetos, no entanto, não avançaram.
Salários, auxílios e benefícios: R$ 170 mil mensal por deputado
A soma de toda a verba que os parlamentares efetivamente recebem inclui salário mensal, auxílio-moradia e direito ao ressarcimento integral de suas despesas com saúde (benefício que é estendido ao cônjuge e dependentes com até 21 anos de idade). Eles também têm direito à cota para o exercício da atividade parlamentar, que cobre passagens áreas, hospedagem, combustível e outras despesas, além de verba para contratação de pessoal, lembra Jayane Maia.
Segundo a pesquisadora, todos esses valores mensais se discriminam da seguinte maneira:
- Salário (R$ 33.763);
- Verba de gabinete (em torno de R$ 100 mil);
- Auxílio-moradia para parlamentares que não ocupam apartamento funcional em Brasília (em torno de R$ 4.200).
O reembolso de despesas médico-hospitalares e a cota para exercício de atividade parlamentar, variáveis, não entram nessa conta.
A distância do estado do deputado em relação a Brasília é um fator que altera a cota de exercício de atividade parlamentar, considerando a diferença de valor das passagens aéreas.
“O deputado do Distrito Federal é o que recebe a menor cota: cerca de R$ 30 mil. Com isso, ele ganha cerca de R$ 170 mil por mês, contando salário e demais benefícios. Podemos dizer que esse é o gasto mínimo mensal de um parlamentar no Brasil. Mas um deputado de outro estado recebe um valor total maior que esse”, ressalta a pesquisadora.
Sistemas (e geografias) diferentes
O cientista político Leonardo Bandarra, também do Giga Hamburgo, pondera que a geografia brasileira acaba implicando na necessidade de certos auxílios que não seriam pertinentes a nações menores, como os países europeus.
“As pessoas fazem muitas comparações entre o Brasil e a Alemanha, o Brasil e a Suécia, mas é difícil comparar porque são países com populações menores e sistemas nos quais o eleitor tem um maior controle sobre o representante e o Parlamento. Normalmente são sistemas unicamerais. No Brasil, é bicameral [Câmara dos Deputados e Senado]”, diz.
Além disso, por serem países menores, há uma maior facilidade de transporte entre as bases e a capital, explica o pesquisador.
“Nesse caso, eles pagam menos também. E são países com maior controle das finanças públicas. Nesse sentido, sim, você tem menos assessores, e muitas vezes não precisa de residências oficiais”, afirma.
Tais diferenças justificam, no entendimento dele, que o Brasil tenha “excessos”, como “uma verba de gabinete, muitas vezes mais do que o necessário” e mesmo “uma quantidade de deputados grande, um parlamento grande, inchado”.
Bandarra aponta que alguns auxílios extras a que parlamentares brasileiros têm acesso não existem em outras democracias. E lembra que, em países europeus, é comum políticos andarem de transporte público.
“Por exemplo: o auxílio-moradia para quem já mora na cidade ou quem tem imóvel próprio. E auxílios extras, de gasolina, de carro oficial. Não há nada comparável em alguns países, como a Alemanha”, analisa.
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