Enxaqueca é a sexta doença que mais incapacita, mas tem tratamento

A enxaqueca é conhecida por provocar uma dor de cabeça que dura algumas horas e muitas vezes vem acompanhada de náuseas, sensibilidade à luz, ao som, tontura, fadiga e falta de apetite. A doença é a sexta mais incapacitante do mundo, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), e atinge 15% da população mundial.

No Brasil, cerca de 31 milhões de brasileiros sofrem com enxaqueca, a maioria com idade entre 25 e 45 anos. As mulheres representam 25% das pessoas que convivem com a patologia, o dobro da prevalência entre os homens. Em relação às crianças, a ocorrência é de 3% a 10%, afetando ambos os sexos antes da puberdade e após tendo predomínio no sexo feminino.

Uma pesquisa feita pela Novartis e a European Migraine and Headache Alliance (EMHA) mostra que as pessoas com enxaqueca chegam a perder cerca de uma semana de trabalho por mês em decorrência do problema. Esse foi o maior estudo global já realizado com pacientes que enfrentam a doença e envolveu mais de 11.266 pessoas de 31 países, incluindo o Brasil.

Diagnóstico simples e rápido
A patologia, na maioria das vezes, é diagnosticada de forma rápida e simples, a partir de informações reunidas no consultório. “A enxaqueca é um tipo de dor de cabeça que ocorre em pessoas geneticamente predispostas. É desencadeada por alterações neuroquímicas em diversos componentes do Sistema Nervoso Central que levam à sensibilização de estruturas como nervos, músculos e vasos sanguíneos. O diagnóstico é clínico, ou seja, os sintomas e o exame neurológico no consultório são suficientes, não sendo necessário exame complementar para diagnosticar a enxaqueca”, explica a neurologista da NeuroAnchieta, Dra. Fernanda Ferraz.

Entre os tabus relacionados à enxaqueca, está o medo de uma doença grave cerebral, mas a especialista afirma que a patologia não costuma ter relação com algo mais sério. “Ela não é causada por tumores, aneurismas ou trombose cerebral. Exames de imagem do cérebro ou dos vasos sanguíneos cerebrais são solicitados pelo médico apenas quando há dúvida ou alguma suspeita de que a dor de cabeça não seja enxaqueca. Por isso, é importante procurar um profissional, porque sabemos, por meio de estudos, que alguns pacientes podem ter risco aumentado de AVC. Mas isso em casos específicos”, afirma a especialista.

Quando o paciente apresenta sinais de alerta normalmente são solicitados exames de imagem pra melhor avaliação do quadro. “Existem inúmeras causas de dor de cabeça na população em geral que vão desde privação do sono, estresse, cansaço, desidratação até causas mais graves e complexas. O neurologista poderá solicitar tomografia computadorizada e/ou ressonância magnética se suspeitar de alguma possível patologia. Esses exames são capazes de confirmar ou afastar uma causa de maior gravidade”, explica o responsável técnico do Anchieta Diagnósticos, Dr. Anderson Benine Belezia.

Mais de uma forma de enxaqueca
A enxaqueca é classificada quanto a frequência, sintomas associados e subtipos genéticos específicos. “Quando a dor ocorre até 14 vezes por mês é chamada de episódica. Acima de 15 vezes, com até oito episódios e características típicas por no mínimo 3 meses seguidos, é considerada crônica. Alguns pacientes têm a aura (manchas, raios, luzes, formigamento ou dormência, vertigem ou fraqueza em um dos lados do corpo), um sintoma neurológico que acontece antes ou durante a dor. É bom ter atenção a aura porque estudos dizem ser um fator de associação a maior incidência de doenças cardiovasculares. Mas isso não quer dizer que a pessoa terá um AVC, por exemplo. Basta fazer acompanhamento correto, preventivo”, enfatiza a neurologista.

Entre as possíveis alavancas de uma crise está a alimentação, frequentemente citada pelos pacientes. “A exposição a alguns embutidos, defumados, adoçantes, álcool, queijos, outros derivados de leite, chocolate pode desencadear uma crise em algumas pessoas. O que se deve fazer é evitar os gatilhos específicos que são identificados como causadores da dor. Não existe dieta específica para enxaqueca, então não adianta retirar alimentos se a pessoa não percebe o que desencadeia a enxaqueca”, acrescenta Dra. Fernanda Ferraz.

Novos medicamentos
Um novo medicamento, já utilizado em outros países, foi lançado no Brasil. O erenumabe é um anticorpo receptor para a substância CGRP (peptídeo relacionado ao gene da calcitonina) que é liberado em grande quantidade durante as crises, no cérebro e no nervo trigêmeo (estrutura responsável pela percepção dolorosa em grande parte da cabeça). “Ele é administrado via subcutânea com uma injeção mensal e não age dentro do cérebro, mas sim na meninge (membrana que envolve a superfície cerebral) e no trigêmeo. Até 40% dos pacientes com enxaqueca crônica e episódica apresentaram diminuição de 50% dos episódios de dor. Resultado positivo e com pouco efeito colateral”, conta a neurologista da NeuroAnchieta.

Automedicação e a enxaqueca
O Brasil ainda é recordista mundial de automedicação, hábito comum em 77% da população, de acordo com o Conselho Federal de Farmácias (CFF). Quase metade dos brasileiros, 47%, se automedica ao menos uma vez por mês e 25% faz isso todo dia ou uma vez na semana. A prática pode atrapalhar no controle das doenças. “Uso excessivo de analgésicos comuns por mais de 15 dias no mês e analgésicos para enxaqueca por mais de 10 vezes faz com que o sistema natural de controle de dor do cérebro não funcione adequadamente e a dor piora em intensidade e frequência. O principal problema associado a isso é a cronificação dessa dor”, explica a neurologista.

A medicação correta, prescrita por um especialista, pode diminuir as crises. E há variedade e possibilidades de tratamentos. “Existem diversos medicamentos para tratamento em longo prazo, como antiepilépticos, antidepressivos, ansiolíticos, antivertiginosos, antiarrítmicos, anti-hipertensivos e toxina botulínica. Eles foram desenvolvidos para outras doenças, mas estudos demonstraram efeito e segurança também para a enxaqueca”, acrescenta Dra. Fernanda Ferraz.

Conviver com a doença é possível, seja com medicamentos, atenção aos possíveis fatores que desencadeiam as dores ou terapias alternativas. “A atividade física é uma aliada no tratamento e prevenção. Para efeito significativo são necessários pelo menos 150 minutos de exercícios aeróbicos por semana. Outras estratégias adjuvantes são a acupuntura, biofeedback e o estimulador transcutâneo do nervo trigêmio. Procurar um especialista, fazer acompanhamento correto e seguir o protocolo recomendado são fundamentais para garantir qualidade de vida”, conclui a neurologista.

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