A sonda Voyager-2 se tornou no mês passado a segunda espaçonave enviada da Terra a atingir o espaço interestelar, seis anos depois de sua irmã-gêmea, a Voyager-1. A notícia foi divulgada pela Nasa, a agência espacial americana, nesta segunda-feira (10).
Há uma certa confusão sobre o que significa “chegar ao espaço interestelar”, então vamos tirar isso da frente logo de cara. O Sol é uma estrela e, como tal, tem um poderoso campo magnético que guia o chamado vento solar — uma torrente de partículas que é emanada em todas as direções a partir dele e predomina numa região conhecida como heliosfera. Conforme vamos nos afastando, o campo magnético vai se enfraquecendo e, num determinado momento, as partículas do vento solar passam a não mais predominar sobre o ambiente, que passa a ser marcado pelos raios cósmicos vindos de fora. Essa é a fronteira que a Voyager-1 cruzou em 2012, e a Voyager-2 atingiu agora, em 5 de novembro último.
Isso, claro, não quer dizer que a nave tenha cruzado o objeto mais distante a orbitar o Sol. Estima-se que existam objetos fracamente presos ao Sol a até um ano-luz de distância (cerca de 63,2 mil unidades astronômicas) dele, e a Voyager-2 está agora a apenas 119 UA. Ainda assim, não devemos desprezar essa viagem; Ultima Thule, objeto que a sonda New Horizons está prestes a explorar depois de ter passado por Plutão, em 2015, está a muito mais modestos 43 UA do Sol. (Esses números dão uma boa noção da diferença dramática que é explorar o Sistema Solar e tentar visitar outras estrelas; a mais próxima, Alfa Centauri, está a 4,2 anos-luz, ou 265,4 mil UA.)
O resultado é cientificamente muito relevante. No caso da Voyager-1, porque até então essa divisa entre o domínio magnético do Sol e o espaço interestelar era conhecida apenas por meio de modelos. E no caso da Voyager-2, por oferecer medidas numa outra direção de saída da “bolha solar”, já que a Voyager-1 foi arremessada para fora do plano da órbita dos planetas após o encontro com Saturno, em 1980, e a Voyager-2 seguiu em frente para encontrar Urano, em 1986, e depois Netuno, em 1989, antes de rumar para fora do Sistema Solar. Ambas foram lançadas da Terra em 1977.
E a Voyager-2 ainda ofereceu um bônus: um instrumento crucial para medir o ambiente de partículas pelo qual viaja a espaçonave, o Plasma Science Experiment (PLS), ainda está funcionando; na Voyager-1, ele estava pifado, o que dificultou identificar a passagem pela fronteira da heliosfera.
A Voyager-2 inicia sua jornada interestelar. Godspeed! (Crédito: Nasa)
As duas espaçonaves vão continuar em operação, enviando dados para a Terra e ajudando na compreensão das regiões afastadas pelas quais estão viajando. Mas a eletricidade para mantê-las ativas está acabando. Elas são equipadas com RTGs (em essência, pilhas de plutônio radioativo que geram calor, então convertido em energia elétrica) e, depois de 41 anos no espaço, seu rendimento é cada vez menor. Os instrumentos devem começar a ser desligados um a um para economizar energia e provavelmente todos estarão desligados, encerrando a missão, até 2030. Dali em diante, ambas serão objetos inertes a vagar pelo espaço entre as estrelas da Via Láctea.
Os resultados detalhados do marco atingido pela Voyager-2 foram apresentados nesta segunda-feira (10) na reunião de outono da União Geofísica Americana (AGU), em Washington. Confira abaixo a entrevista que fiz tempos atrás com Ed Stone, cientista-chefe da missão, sobre os principais marcos dessa incrível jornada de exploração.
MENSAGEIRO SIDERAL
Salvador Nogueira